O Inverno

o inverno na matinha

Está frio de rachar. Um gelo de congelar os ossos. Como se um dragão confuso, tivesse cuspido, por engano, um bafo de geada em vez de fogo. Também as crianças, que madrugam e logo saem do quarto para brincar, fingem fumar cachimbo, expirando o ar condensado com paus pendurados no canto da boca.

Lá fora, do outro lado da janela, as árvores e os arbustos deixam adivinhar o Inverno em que vivem. Todos despidos e com os galhos a tiritar ao vento, permanecem hirtos e convictos de que ali é o seu lugar, apesar do esqueleto de troncos magricelas não aparentar resistência alguma. As aparências iludem.

O orvalho cobre a relva, como um tapete que se agarra à biqueira das botas que lhe passam por cima. O céu cinza e carregado, torce-se numa careta como um bebé antes de fazer birra. Mais tarde ou mais cedo, a chuva virá a ser chorada. O melhor a fazer é encontrar um abrigo para a ver cair, sem ficar ensopado e constipado.

Quando se ganha coragem para sair debaixo do cobertor, que prende num abraço quente e pesado, já o sol escondido, avançou uns quantos passos. Na base da motivação para puxar para o lado as cobertas e arrancar o corpo à ronha, está a promessa de um pequeno-almoço pronto na sala.

Se as árvores nuas se resignam às condições que a Natureza traz, deixando cair as armaduras no rasto da última folha, nós, Humanos, ainda não nos fizemos Homens o suficiente para o fazer. Precisamos de cobrir o corpo com várias camadas de lã e flanela, de enfiar um gorro na cabeça que sobra e fechar o casaco até ao queixo, para tapar o pescoço. Só com isso, e mais um par de botas enfiadas por cima de umas meias grossas, é que ficamos prontos para sair do casulo.

A casa principal respira calor pelo fumo das chaminés. O leite é aquecido em lume brando, ao lado, dos ovos mexidos que fazem omeletes. As panquecas esperam empilhadas num prato, e o chá fervido está à temperatura ideal para ser bebido: quente que chegue para aconchegar por dentro, frio o suficiente para não queimar a língua.

Entre o pão alentejano, o bolo, o iogurte com granola caseira, a fruta e os croissants estaladiços, o único problema do pequeno-almoço é o que obriga a decidir. Quer-se tudo, mas tudo é demais. Ou então, assume-se o grande-almoço, e volta-se a chamar a fome à hora do lanche. Há espaço para tudo e tempo para escolher não falta. A única coisa que não existe, é pressa.

De barriga cheia, falta encher o resto do dia. Levar as botas a passear, é o melhor passatempo que uma manhã invernosa na Matinha pode pedir. O caminho é por onde os cães nos quiserem levar. O Dino e a Gina vão à frente, lançados numa corrida desenfreada, a ver quem chega primeiro a uma meta que não existe. Já a Paz, segue o ritmo dos companheiros de duas patas, e, de quando em quando, roda o pescoço para se certificar que a matilha não deixou ninguém ficar para trás.

O passeio abre o apetite, e a fome abre as hostes de uma almoçarada tão bem servida, que rapidamente vira sesta. Quando se desperta de novo, debaixo de uma manta, aí se fica. Com um livro numa mão, e uma chávena de chá na outra, lê-se uma história à luz da salamandra, que bombeia calor para a sala inteira.

Do que se passa do outro lado da janela, já nada se vê. O dia caiu depressa, e a noite chegou a tempo de o substituir. Agora, pelo vidro, vê- se apenas o reflexo do interior: Um cenário acolhedor, feito de mantas, fogo e bolo caseiro.

Dizem que o inverno é duro e rigoroso, mas, na Herdade da Matinha, esta estação é tratada como qualquer hóspede que por aqui passa: Um alguém com direito a todos os mimos e requintes para se sentir bem-vindo quando chega e essencial quando está. Com o coração aquecido desta forma, não há frio que não derreta o gelo e o transforme em algo apetecível.

É assim, que se fica tão entregue e rendido ao Inverno, quanto as árvores em tronco nu lá fora, que, apesar de não se verem, sem dúvida que lá estão, resilientemente enraizadas no chão que pisam.

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